Eu preciso de inspiração. A maioria das histórias que a gente ouve — tipo biografias — começa com o cara lá, ferrado, e de repente alguma coisa acontece e ele fica rico, se dá bem ou tira a sorte grande.
Eu perdi meu mentor recentemente. Ele era meu tio de sangue, mas foi muito mais: meu primeiro e único patrão, meu mentor, meu pai de coração. Foi ele quem bancou meus estudos. Um cara estudioso, boêmio, gostava de uma farra. Inclusive, apresentei o GP Guia pra ele e ele ficou maravilhado, pediu até que eu ensinasse, porque se dizia "analfabyte", como ele mesmo falava.
Tenho só 30 anos. Já quebrei, perdi tudo. Confiei nas pessoas erradas, emprestei meu nome… Mas não estou aqui pra contar história triste.
O que acontece é que eu tinha uma referência. Alguém que sempre estava muitos passos à minha frente. Uma bússola. E perdi isso. Hoje sou a minha própria referência. Às vezes me pego pensando: “O que meu tio faria nessa situação?” Ele era um cara visionário. Atendia uma comunidade estrangeira — não posso citar qual, senão vão acabar reconhecendo — mas era muito famoso na área dele. Carismático.
Pra ter uma ideia, nos últimos dias de vida, internado e sem plano de saúde, os próprios clientes se uniram e pagaram a conta milionária do hospital particular. No velório, mal dava pra ver o corpo de tantas flores e homenagens.
Ele fez três faculdades, pós, mestrado, doutorado, dava aula em universidade… Era “o cara”. Conversava muito com ele.
Me ensinou muita coisa. Uma delas: orar pra Deus e pedir tudo, sem medo. Segundo ele, tudo o que pediu a Deus, conquistou. Só esqueceu de pedir uma mulher que o amasse (estava no quarto casamento) e filhos que o amassem.
Hoje, os filhos brigam pela herança — que já foi metade torrada em menos de um ano depois do falecimento. Mas, pra mim, ele deixou algo muito mais valioso do que bens materiais: me deixou experiência, sabedoria, e o trato com os clientes. Muitos, até hoje, me procuram por causa dele. Me indicam por causa dele.
Tudo o que eu faço hoje como autônomo, tudo que me sustenta, aprendi com ele. Sou mais do que grato.
Conversávamos muito, até nas noites de boemia. Eu era quem o buscava nas esbórnias da vida e levava pra casa. O filho saía com o pai pra almoçar, o pai pagava tudo. Iam pra boate, o filho enchia a cara na conta do pai — depois me ligava pra ir buscar ele também.
Apesar de o vício na bebida ter sido um ponto fraco do meu tio, nunca me atrai pela bebida, nem fumo, nem nada disso.
Trabalhamos juntos por 15 anos. Comecei como office boy, passei por todos os setores até chegar na área que atuo até hoje. Almoçávamos juntos, sonhávamos juntos, trocávamos ideias.
Ele também passou por perrengues. Quebrou, perdeu tudo, mandou todo mundo embora. Depois, fez parcerias com outros escritórios até se reerguer. Sei que não foi fácil.
E eu também quebrei. Recentemente, em 2022, perdi tudo. Nome, bens, virei réu, sofri penhora… um caos. E o pior: nem foi por dívida minha. Emprestei o nome, a pedido dele. Ele, do leito de morte, ainda me perguntava se eu tinha conseguido resolver o problema.
E hoje sigo, juntando os cacos. Não tem sido fácil. O câncer o levou muito rápido, coisa de seis meses.
Acho que ainda estou de luto. Mas não é esse o ponto principal.
Vim aqui pra ouvir histórias de pessoas maduras. E o que entendo por maturidade? Bom… meu tio tinha 60 anos quando partiu.
Quero ouvir histórias. Não só do sucesso, mas dos perrengues. Aquilo que você passou e ninguém viu. Só você e Deus. Aquelas fases em que parecia que não ia dar, que não ia ter volta. A encruzilhada. A parte feia da jornada que ninguém mostra. O que você teve que fazer? Como superou? Como atravessou o deserto?
Porque é nele que eu estou agora.
Perdi meu tio. Perdi dois filhos que estavam no ventre da minha esposa. Perdi meu nome. Meus bens. Minha reserva financeira. Só não perdi minha fé em Deus.
E sigo. Não tem sido fácil.
Mas quero ouvir vocês. Histórias reais. Curtas ou longas. Eu preciso me inspirar. Preciso achar um caminho pra sair desse buraco.