Compson escreveu:Contabilidade de empresa pública é um ninho de vespas... Vou formar minha opinião por aí, depois eu volto...
Não falei? Na verdade, o buraco é mais embaixo...
Quando notei que a notícia era antiga (março), achei estranho o governo não ter feito estardalhaço e fui pesquisar melhor... A idéia geral do meu post anterior é válida, mas os procedimentos contábeis são diferentes do que eu imaginava. Vejam:
Vamos supor que o Tesouro vá fazer um aporte de 10 bilhões no BNDES.
Nesse caso, o Tesouro confere ao BNDES títulos no valor de 10 bilhões atualizados pela Selic (ou uma taxa próxima) e o BNDES emite ao Tesouro títulos no valor de 10 bilhões atualizados pela taxa de juros de longo prazo (TJLP), que está em 6%. Ou seja: o BNDES paga 6% de juros ao Tesouro e o Tesouro paga 12% de juros ao BNDES.
Quando o BNDES acerta um empréstimo com um “cliente” privado, ele vende os títulos do Tesouro no mercado secundário e confere o crédito.
Porém, enquanto não fizer o empréstimo, o BNDES fica com o título do Tesouro e lucra com o diferencial de juros. Por exemplo, vamos supor que o BNDES fique um ano com o título: ele vai pagar 600 milhões de juros ao Tesouro (TJLP) e vai receber 1,2 bi do Tesouro (Selic), perfazendo um lucro de 600 milhões, que é apenas uma arbitragem! Depois, o BNDES paga esse valor de volta esse valor ao Tesouro como lucro no final do exercício.
Mas por que diabos o Tesouro aceita esse procedimento, já que se trata apenas de uma passagem de dinheiro pelo banco?
Todos sabemos que, por obrigação legal, o Ministro da Fazenda tem de apresentar no final de cada ano um superávit primário determinado pelo Congresso (ou pelo CMN, não lembro)... Se ele não fizer isso, pode vir a ser acionado pelo Ministério Público, além de ficar com fama de incompetente.
Pois bem, o resultado primário é a soma de todas as receitas e despesas do governo federal,
excluídos os pagamentos de dívida e juros.
Quando paga os juros ao BNDES, o Tesouro não contabiliza esse pagamento como despesa (no exemplo, -1,2 bi) no resultado primário. Mas ao receber o mesmo dinheiro como lucro do BNDES, esse valor (+600 bi) é contabilizado como receita primária.
Ou seja: o “lucro” do BNDES é apenas uma maneira (intelectualmente desonesta) de
transformar pagamento de juros em receita primária, aumentando artificialmente o superávit.