O texto é bom mesmo, mas é limitado... Já tinha ouvido alguns elogios por aí e esperava mais.
Os adolescentes do funk ostentação, por sua vez, compram tênis caríssimos para se distinguir dos colegas de bairro que ainda não conseguiram empregos ou renda para comprar um Mizunão de mil reais. Quando pego o trem para Caieiras, essas redes de diferenciação ficam claras. Não é só em Higienópolis que as pessoas evitam o contato com a “gente diferenciada”. Se há algo constante no mundo é a necessidade de uma boa parte das pessoas em se colocar em rankings para mostrar que, por alguma razão, é melhor do que a multidão. O cara do funk ostentação não quer ser confundido com o vizinho camelô.
[grifos do Gafa]
Essa distinção "funk ostentação" x "vizinho camelô" não faz sentido. O camelô também pode gostar de funk... Veja esse
perfil de um dos organizadores de rolezinhos: "estudante do terceiro ano do ensino médio em um colégio público da zona leste que faz bicos como ajudante de pedreiro". Parece um "novo classe média" querendo esfregar a ascensão na cara dos outros?
E, sim, o "funk ostentação" é uma estratégia de diferenciação. Como qualquer identidade, como o texto mostra a seguir com relação ao rock... Inclusive ficar debulhando crônicas de uma periferia-esfinge que "poucos entenderam" é uma forma de diferenciação e reivindicação de um espaço de autoridade.
Ok, existem estratégias mais e menos legítimas, mas isso já implica um julgamento de valor que precisa ser feito e debatido... Mas, com relação ao funk, o cara não passa do "elogio às marcas" e da falta de senso crítico.
O rolezinho não é uma questão simples, mas acho que podemos descartar facilmente as teses extremadas da esquerda e da direita porque elas não encontram nenhum respaldo da realidade. É difícil ver protesto político na vontade de usar um Mizunão de mil num espaço da periferia da cidade que já é frequentado, individualmente, por essas pessoas. E é ainda mais difícil ver marxismo cultural no funk ostentação. É muito difícil taxar de elitismo uma ação de pessoas da periferia contra pessoas da periferia. Como, afinal, acusar um morador de Itaquera de elitismo contra o filho do seu vizinho, também morador de Itaquera?
É difícil ver "protesto político" porque não há...
No rolezinho, há um
ato político, que consiste na reunião coletiva de certo grupo de pessoas, que promove insegurança em outros grupos.
As coisas não mudam porque alguém sai para protestar com um cartaz bonitinho. As coisas mudam porque os sujeitos deixam de agir, às vezes sem bandeira política alguma, do modo que lhes é prescrito pela sociedade. O exemplo clássico é Rosa Parks...
A reação das pessoas que frequentam os shoppings das periferias aos rolezinhos não passa nem pela tese de luta de classe, como algumas pessoas à esquerda vem dizendo, nem pela resistência à concretização dos projetos malévolos dos marxistas culturais para dominar o mundo, como algumas pessoas mais à direita vem enfatizando – e vou lhes poupar dos links porque, afinal, o papel do Oene também é dizer o que você não precisa ler. Os argumentos principais das pessoas mais à esquerda é que os rolezinhos são uma manifestação política com o objetivo de ocupar os espaços que são negados aos pobres pela sociedade de consumo. O problema é que não há nenhuma bandeira ou sinal nesse sentido, como nota Vinicius Torres Freire em um bom texto na Folha de S.Paulo. Os rolezinhos não vêm com faixas ou bandeiras. Não há crítica ao consumo, mas elogio às marcas. Essas pessoas já frequentam os shoppings da periferia, onde os rolezinhos acontecem, em grupos pequenos. É difícil ver reivindicação de espaço em um espaço que elas já frequentam. E isso também complica os argumentos da baderna, à direita. Não há crítica ao sistema. Apenas a vontade expressa em roupas de marcas em participar ativamente dele.
Não devia ter poupado os links porque eu nunca ouvi as sandices de esquerda e direita que ele menciona. Ok, se pegar blogueiro da Veja e grupo de extrema esquerda, talvez ache algo assim, mas o quanto isso é representativo? O cara está lutando com o vento...
Quem falou em crítica ao sistema? Que "sistema"? Trata-se simplesmente de pessoas tentando agir com liberdade...
E, ok, esses caras já frequentavam o mesmo shopping em "grupos pequenos". Mas, peraí, não faz diferença ir em grupos de 6 amigos ou em uma multidão organizada de mil pessoas? Vocês não vêem nenhuma diferença política nisso?
Se esses caras estão totalmente assimilados pela "sociedade de consumo"; se suas ações não fazem "nada contra o sistema"; se são apenas pobres tentando se diferenciar de pobres... Então por que os rolezinhos causam tanto? Por que eles podem ir no shopping em pequenos grupos mas não em grandes?
Esse é a questão relevante colocada pelos rolezinhos, que precisamos encarar, não nos esconder na periferia-esfinge de cada um, ela mesma incapaz de dar uma resposta...